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terça-feira, 3 de abril de 2012

Panela Macuxi

A cerâmica é o artesanato mais representativo das mulheres macuxis, principalmente daquelas da região da Raposa. Tradicionalmente eram produzidas somente panelas, hoje outros produtos, como jarros, potes e pratos, surgem da criatividade e das mãos habilidosas das artesãs. 

O processo de fabricação das panelas se inicia no momento da retirada do barro. As mulheres relatam que as ceramistas mais antigas obedeciam a um ritual para retirada do barro, que compreendia em pedir licença ao dono do barro, passar urucum no corpo, passar e comer pimenta e fazer certas orações. 

Apesar de ser um artesanato reconhecido localmente, as artesãs ainda têm muita dificuladade na comercilaização de seus produtos, e não possuem uma organização ou cooperativa que possibilite maior acesso ao mercado. 


terça-feira, 6 de março de 2012

Pia daktai - um “tempo de origem”

No elenco dos gêneros orais taurepang, as narrativas pessoais, assim como os mitos que tematizam as façanhas do herói criador Makunaíma, recebem o qualificativo de pandon, termo traduzido pelos Taurepang como “histórias”.

Os acontecimentos narrados nos mitos ocorrem em um tempo que os Taurepang chamam de Pia daktai, um “tempo de origem”, quando a terra, os homens e os animais assumem a forma que até hoje possuem, ao passo que as narrativas de cada um a respeito da sua vida e de seus pais teria acontecido “agora”, sereware, indicando tratar-se de acontecimentos muito mais recentes do que o ocorrido no Pia daktai.

A passagem de um tipo de relato a outro não obedece qualquer regra formal: nada impede que um informante passe do relato a respeito das peripécias de Makunaíma pela região do monte Roraima a um outro a respeito de uma aldeia situada na mesma área no tempo de sua juventude. Temos assim uma espécie de compressão do tempo à medida que a narrativa se aproxima do presente, um período mais repleto de detalhes e lembranças.

Makunaima
O ciclo mais importante da mitologia taurepang versa sobre a saga do herói cultural Makunaima, ora referido como uma só personagem, ora como um grupo de irmãos, como no relato colhido pelo padre C. de Armellada (1964:32ss). No “tempo da origem”, homens e animais possuíam a forma humana, pemon-pe. Compartilhando com os demais seres da terra uma existência pré-social, os irmãos Makunaima – nascidos da união do sol, Wei, com uma mulher feita de barro – perambulavam à procura do pai, que havia sido raptado pelos Mawari, espíritos malfeitores que habitam o interior das serras. É na região do monte Roraima que encontram novamente o pai cativo, que, uma vez livre de seus raptores, sobe ao céu, abandonando seus filhos na terra.

Os irmãos Makunaima permanecem na região do monte Roraima a vagar, seguindo alguns animais – entre os quais a cotia, akuri – a procura de comida. São esses animais que indicam ao herói a “árvore do mundo”, o wasaka, de onde retiravam todos os frutos comestíveis. Extasiado com a abundância dessa árvore, Makunaima, em um ato de avidez desmedida, a derruba. Do que restou do tronco jorrou muita água, o que veio a provocar uma grande inundação; ao dilúvio, sucede-se um grande incêndio, que destrói os homens e os animais. Após este cataclisma, Makunaima faz novos homens e novos animais com barro, dando-lhes vida (Koch-Grunberg, 1924/1981, II:43; Armellada, 1964:60). O Monte Roraima, contam os Taurepang, seria a raiz desta árvore que permaneceu após a grande inundação, apontando para sua forma, apesar das grandes proporções, semelhante a um tronco partido.

Este é o episódio mais comumente apontado entre as façanhas de Makunaima. Em diversas outras, o herói transforma os vários seres com que se depara em rochas. Ao final, Makunaima parte em direção a leste, para o outro lado do monte Roraima, deixando para trás um mundo onde permanecem cristalizadas, principalmente nas formações rochosas do território taurepang, diversos de seus feitos. Depois disso Makunaima não mais intervém entre os homens, deixando-lhes, porém, uma triste herança: o mundo a que ficam relegados já não possui a mesma natureza daquele em que se vivia antes do corte da grande árvore; os seres de “agora”, sereware, perderam a identidade que outrora possuíam, já não são todos Pemon. A alteridade é, assim, introduzida no mundo.Se antes todas as coisas eram gente, pemon-pe to ichipue, após a grande inundação os vários personagens que aparecem nos pandon distanciar-se-ão dos homens, localizando-se em domínios específicos e engendrando novas relações com os seres humanos, as quais estarão revestidas de um antagonismo explícito.


Fonte: http://pib.socioambiental.org/pt/povo/taurepang/117

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Monte Roraima e a Perambulação de Macunaima

O Monte Roraima se apresenta como um importante local para as etnias que vivem em seu entorno (em especial Ingarikó, Macuxi, Taurepang, e Ye'kuana) por ser a morada do Deus Macunaima - demiurgo de suas culturas.




O índios Macuxi contam que Macunaíma percebeu entre os dentes de uma cotia, adormecida de boca aberta, grãos de milho e vestígios de frutas que apenas ela conhecia; saiu, então, a perseguir o pequeno animal e deparou com a árvore Wazacá – a árvore da vida –, em cujos galhos cresciam todos os tipos de plantas cultivadas e silvestres de que os índios se alimentam. Macunaíma resolveu, então, cortar o tronco – Piai – da árvore Wazacá, que pendeu para a direção nordeste. Nessa direção, portanto, teriam caído todas as plantas comestíveis que se encontram até hoje, significativamente nas áreas cobertas de mata.


A perambulação de Macunaima - apresentada em livro de Mário de Andrade - é também contada na tradição oral destes povos. Essa tradição reconhece na geografia do Estado de Roraima os locais sagrados ligados à sua rota mítica.



"Para os indígenas da região, Makunaima tem uma existência real neste mundo. As marcas de sua passagem podem ser percebidas ainda hoje nas diversas realizações que deixou sobre a face da terra: transformou homens, mulheres, formigas e feridas em pedras, folha de plantas em arraia, grãos de areia em mosquito pium, dentre muitas outras obras e artes. Trata-se de um ser que desde menino já era esperto, a quem todos respeitavam pela astúcia de ser capaz de pegar anta no laço; detinha força e poderes mágicos; era capaz de castigar a todos os que se interpunham à realização de seus desejos mais imediatos. Sendo herói de uma cultura ágrafa, Makunaima ganha concretude para os Pemon por meio de um conjunto de narrativas que explica fatos diversos como a ocorrência de fenômenos naturais e de acidentes geográficos, bem como a forma de alguns animais e a existência das constelações visíveis naquela região, mas também como teriam sido criadas algumas fórmulas mágicas de cura, dentre outras coisas, como a escassez de árvores e o fato de existirem poucas frutas na região dos lavrados, em contraste com a maior abundância delas na face norte do Roraima. E foi exatamente por apresentarem essa ambiguidade, de terem sido os introdutores do mal no mundo ao mesmo tempo em que foram os criadores de coisas boas para o homem, que os Makunaima passaram a ser das personagens mais conhecidas do extremo norte da América do Sul".
Fábio Almeida de Carvalho - Makunaima/Makunaíma, antes de Macunaíma.Revista Crioula / Maio de 2009 - nº 5.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Variedades e Usos Culturais da Pimenta em Roraima

Pimentas do gênero Capsicum cultivadas em Roraima, Amazônia brasileira. II. Hábitos e formas de uso (fragmento)
Herundino Ribeiro do NASCIMENTO FILHO1, Reinaldo Imbrozio BARBOSA2, Francisco Joaci de Freitas LUZ

OS INDÍGENAS

Dos 180 acessos de pimentas (163 de espécies domesticadas) coletados em Roraima no período de maio/2000 a junho/2001, foram identificados 78 morfotipos que se diferenciavam pela forma, cor e ardência (Barbosa et al., 2002). Destes, 23 foram observados especificamente para etnias indígenas: Wapixana (10), Macuxi (9), Patamona (1), Yanomami (1) e Yekuana (1). Nestas comunidades, os morfotipos predominantes foram malagueta (C. frutescens), murupi (C. chinense) e olho-de-peixe (C. chinense). Devido ao esforço de coleta ter sido mais intenso entre as comunidades Macuxi e Wapichana, este resultado acaba refletindo uma situação muito simplificada dos morfotipos utilizados pelas etnias locais, observando-se principalmente aquelas que vivem nas regiões de vegetação aberta denominadas regionalmente por “lavrado” - savanas/cerrados (ver Barbosa & Miranda, 2005)

A coleta de pimentas nas etnias indígenas presentes no ecossistema de florestas foi muito reduzida devido a problemas de acessibilidade. Todavia, tanto as poucas coletas que obtivemos, quanto os relatos passados, nos dão conta do uso de pimentas nestas localidades como, por exemplo, nos trabalhos de Milliken (1997) entre os Yanomami do oeste de Roraima, e Meggers (1987) nos Waiwai, do sudeste.

Por ocasião das observações nas aldeias do lavrado, foi constatado que, em sua maioria, existia a figura da “pimenteira”. Este termo denomina uma ou mais senhoras (ou famílias) que se dedicam ao cultivo, manipulação e distribuição das pimentas na aldeia e/ou região. Na maior parte das vezes, estas senhoras também se responsabilizam pelo fabrico e comercialização de molhos e pimentas desidratadas/moídas (jiquitaia). Neste caso, entenda-se comercialização como o ato de venda ou troca dentro e fora da aldeia. Não é um papel definido somente pela comunidade, entretanto, estas senhoras (pimenteiras) acabam assumindo esta figura através da leitura que a comunidade faz de seu prazer pessoal no plantio e tratos hortícolas de seu jardim doméstico.

Do ponto de vista cultural, as pimentas podem assumir diferentes formas simbólicas refletidas diretamente em sua forma de uso. Por exemplo, para os Macuxi, situados no centro-norte e nordeste de Roraima, andar no mato com fome e sem pimenta é muito perigoso, pois isto pode levá-los a ser atacados pelos espíritos das matas.

Na Aldeia Maturuca, o professor da escola indígena local (Prof. Sobral André, índio Macuxi) nos informou que naquela localidade as pimentas são usadas para fazer molhos à base de tucupi (escorrido da macaxeira), além do caldo (damorida) e da jiquitaia. A jiquitaia é geralmente preparada primariamente pela secagem da pimenta ao sol ou torrada no forno ou na pedra. Em seguida ela é moída em pilão e, na formulação atual, é adicionada uma quantidade variável de sal, muito embora antes do contato com o “... branco... ” este último ingrediente não existisse. “Também se usa pimentas para espantar os maus espíritos ou feitiços ... espíritos da natureza que nós acreditamos que fazem mal” (Prof. Sobral André, índio Macuxi).

Os benzedores (pajés) utilizam as pimentas para curar doenças que só eles possuem o poder de tirar. Os pajés Macuxi, quando “... atuados ...” (em transe), usam pimentas em seus ritos, mas não conseguem se lembrar de quais e nem de quanto usaram nas composições indicadas aos doentes quando despertam do transe.

Entre os Macuxi, ao se doar uma pimenta in-natura a uma pessoa, é costume nunca entregar diretamente na mão deste, pois isso pode provocar o rompimento da amizade no curto prazo. Para tanto, deixam-se as pimentas em um local onde a pessoa interessada possa ser avisada para que possa pegá-las. “Assim a amizade durará muito ...”.

Entre os Wapichana, segundo Nádia Farage em um pronunciamento realizado na Universidade Federal de Roraima em março de 2002, as pimentas também são usadas pelos familiares dos indivíduos mortos por ataque do “Canaimé” (figura mística). Estes colocam os frutos sobre sua sepultura para que o mesmo não venha completar o serviço. Neste caso, o termo “completar o serviço” possui o significado de comer, através dos animais que lhe representam (tatu, tamanduá, etc), os restos do cadáver.

Além das pimentas domesticadas, os índios de Roraima também utilizam outras espécies (semi-domesticadas e silvestres). A mais interessante, e que nos chamou a atenção, foi o uso de uma pimenta silvestre que nasce naturalmente em serras ou pé-de-serra das regiões do centro-norte e nordeste de Roraima. Para os indígenas, estas pimentas são plantadas em suas roças pelo “Curupira” ou “Ataí-taí”. Por causa desta crença mística, esta pimenta recebe o nome simbólico de “Pimenta do Curupira” ou simplesmente “pimi’ró” (pimenta pequena, na língua Macuxi). Esta espécie silvestre é uma Capsicum chinense que posiciona Roraima como um dos centros de dispersão desta espécie nesta região do extremo norte amazônico (ver Barbosa et al. 2002; 2006).

O uso simbólico e medicinal da pimenta pelos índios do lavrado (cerrado/savana) é também muito amplo. Assim como os Yanomami da floresta, os Macuxi, Wapichana e Taurepang do lavrado também usam a malagueta (C. frutescens) para curar oftalmia, febre e até malária. Usam-na como disciplinadora entre as crianças, quando estas desobedecem ou fazem mal-criação. Para tanto, os pais introduzem um fruto de pimenta malagueta, com a ponta inferior quebrada, no ânus da criança mal-criada para que esta fique obediente e esperta (Tuxaua Antônio, Aldeia do Contão).

Segundo relatos de alguns indígenas Macuxi mais velhos, o ato de introduzir pimentas no ânus também servia para que os adolescentes masculinos se tornassem bravos guerreiros, apurando sua esperteza e corrida. Neste ritual eram usadas lâminas de pedras para se fazer cortes superficiais nos braços, pernas e costas dos adolescentes. Em seguida, uma pasta de macerado de folhas de “curawá” (Agave sp.), juntamente com frutos de pimentas malagueta, era passada sobre os cortes. Segundo os velhos indígenas, neste momento, os adolescentes corriam em volta da casa em grande velocidade e, depois, rumo ao curso d’água mais próximo para aliviar a dor. Esse era um dos ritos de passagem masculino mais usado pelos índios Macuxi do lavrado.

O comércio interétnico, antes da intensificação do contato, usava as pimentas desidratadas e moídas (jiquitaia) como forma de produto de barganha. Este fato foi sempre apontado como uma característica forte dos indígenas da região das serras, que desciam até a região dos lavrados para realizar negócios, trazendo, entre outras coisas, a jiquitaia para trocar por produtos desta região de baixa altitude de Roraima (José Adalberto, índio da Aldeia Enseada, ex-consultor da APIR – Associação dos Povos Indígenas de Roraima).


quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Modo de Fazer a Panela de Barro Macuxi

Neste vídeo é mostrado um resumo do estudo feito pelas jornalistas Andrezza Mariot e Luiza Maura sobre a fabricação tradicional de panelas de barro (argila) pelas mulheres da etnia Macuxi da aldeia da Raposa, em Roraima.

 

Ñaumu - Qual notícia você traz?

Diálogo Cerimonial Yanomami - Forma de Expressão



Diálogo cerimonial ancestral, praticado em várias festas e encontros, como, por exemplo, o ritual do Reahu, quando se trocam bens e notícias. As frases ritmadas são construídas silabicamente, utilizando figuras de retórica. Assim, "um ponto brilhante sob o sol" significa "facão"; "argila" é "coisa colocada sob o sol". Segundo Davi Kopenáwa Yanomami, os Ñaumus, que devem ser interpretados de maneira cordial, têm como finalidade estreitar os laços que unem seu povo.

Índios Yanomami de Roraima
Adaptação e Arranjo: Marlui Miranda
Vocais: Marlui Miranda e Gilberto Gil
Torre: Paulo Santos
Borel: Décio Ramos
CD Ihu Todos os sons de Marlui Miranda

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Diálogos Cerimoniais

Rogério Duarte do Pateo, antropólogo
PALAVRAS E PERFORMANCE - agosto de 2006
Nota:o ensaio foi publicado originalmente no site do programa "Cultura e Pensamento" do Ministério da Cultura.

Em todas as regiões do território Yanomami, a comunicação considerada "oficial" entre diferentes comunidades se dá por meio de um sistema de diálogos cerimoniais pelos quais concretizam-se alianças, realizam-se trocas de bens, cônjuges e notícias. As diferentes formas de sua realização, hereamou, wayamu, hiimou e yaimou obedecem a recursos estilísticos e padrões formalizados de execução que são compartilhados e compreendidos em sua totalidade, geralmente efetuados durante os rituais funerários reahu ou quando há a visita de aliados distantes.

Indo além dos conteúdos da oralidade, estes "atos de comunicação" englobam a esfera performática dos diálogos cerimoniais (gestos, manipulação de objetos, ritmos, etc), concretizando uma série de padrões estruturados de significação através dos quais seu sentido é compreendido e julgado pela comunidade.

O diálogo cerimonial wayamu – foco do ensaio fotográfico aqui apresentado – possui um caráter de competição segundo o qual anfitriões e convidados enfrentam-se em uma prova de talento, resistência e criatividade, mediante frases intercaladas, acompanhadas por movimentos corporais claros e expressivos. Seus corpos balançam na cadência das palavras e suas mãos batem ritmicamente no peito ou nas coxas. O volume, a tonalidade e o tempo dos diálogos se alteram, e cada seção é articulada a movimentos corporais expressivos. Em uma estrutura de pergunta e resposta - na qual geralmente um anfitrião inicia o diálogo, rapidamente seguido pela resposta de seu oponente - os participantes vão alternando-se até o amanhecer.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Panela Macuxi

Visita ao ateliê de Lídia Raposo e Terêncio, que produzem a panela de barro dos índios Macuxi em Boa Vista. A ação de D. Lígia integra a Rede de Pontos de Cultura gerida pela prefeitura Municipal de Boa Vista.