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terça-feira, 6 de março de 2012

Pia daktai - um “tempo de origem”

No elenco dos gêneros orais taurepang, as narrativas pessoais, assim como os mitos que tematizam as façanhas do herói criador Makunaíma, recebem o qualificativo de pandon, termo traduzido pelos Taurepang como “histórias”.

Os acontecimentos narrados nos mitos ocorrem em um tempo que os Taurepang chamam de Pia daktai, um “tempo de origem”, quando a terra, os homens e os animais assumem a forma que até hoje possuem, ao passo que as narrativas de cada um a respeito da sua vida e de seus pais teria acontecido “agora”, sereware, indicando tratar-se de acontecimentos muito mais recentes do que o ocorrido no Pia daktai.

A passagem de um tipo de relato a outro não obedece qualquer regra formal: nada impede que um informante passe do relato a respeito das peripécias de Makunaíma pela região do monte Roraima a um outro a respeito de uma aldeia situada na mesma área no tempo de sua juventude. Temos assim uma espécie de compressão do tempo à medida que a narrativa se aproxima do presente, um período mais repleto de detalhes e lembranças.

Makunaima
O ciclo mais importante da mitologia taurepang versa sobre a saga do herói cultural Makunaima, ora referido como uma só personagem, ora como um grupo de irmãos, como no relato colhido pelo padre C. de Armellada (1964:32ss). No “tempo da origem”, homens e animais possuíam a forma humana, pemon-pe. Compartilhando com os demais seres da terra uma existência pré-social, os irmãos Makunaima – nascidos da união do sol, Wei, com uma mulher feita de barro – perambulavam à procura do pai, que havia sido raptado pelos Mawari, espíritos malfeitores que habitam o interior das serras. É na região do monte Roraima que encontram novamente o pai cativo, que, uma vez livre de seus raptores, sobe ao céu, abandonando seus filhos na terra.

Os irmãos Makunaima permanecem na região do monte Roraima a vagar, seguindo alguns animais – entre os quais a cotia, akuri – a procura de comida. São esses animais que indicam ao herói a “árvore do mundo”, o wasaka, de onde retiravam todos os frutos comestíveis. Extasiado com a abundância dessa árvore, Makunaima, em um ato de avidez desmedida, a derruba. Do que restou do tronco jorrou muita água, o que veio a provocar uma grande inundação; ao dilúvio, sucede-se um grande incêndio, que destrói os homens e os animais. Após este cataclisma, Makunaima faz novos homens e novos animais com barro, dando-lhes vida (Koch-Grunberg, 1924/1981, II:43; Armellada, 1964:60). O Monte Roraima, contam os Taurepang, seria a raiz desta árvore que permaneceu após a grande inundação, apontando para sua forma, apesar das grandes proporções, semelhante a um tronco partido.

Este é o episódio mais comumente apontado entre as façanhas de Makunaima. Em diversas outras, o herói transforma os vários seres com que se depara em rochas. Ao final, Makunaima parte em direção a leste, para o outro lado do monte Roraima, deixando para trás um mundo onde permanecem cristalizadas, principalmente nas formações rochosas do território taurepang, diversos de seus feitos. Depois disso Makunaima não mais intervém entre os homens, deixando-lhes, porém, uma triste herança: o mundo a que ficam relegados já não possui a mesma natureza daquele em que se vivia antes do corte da grande árvore; os seres de “agora”, sereware, perderam a identidade que outrora possuíam, já não são todos Pemon. A alteridade é, assim, introduzida no mundo.Se antes todas as coisas eram gente, pemon-pe to ichipue, após a grande inundação os vários personagens que aparecem nos pandon distanciar-se-ão dos homens, localizando-se em domínios específicos e engendrando novas relações com os seres humanos, as quais estarão revestidas de um antagonismo explícito.


Fonte: http://pib.socioambiental.org/pt/povo/taurepang/117

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

La Piedra Kueka - lugar sagrado dos índios Pemon

A pedra Kueka Abuela, que ficava anteriomente no Parque Nacional Canaima (Venezuela), foi cedida ilegalmente à Alemanha em 1998. A Pedra do mineral jaspe está declarada como bem de interesse cultural para a Venezuela. Tem um grande significado histórico e ancestral para os pemón. Para estes indígenas a pedra é sua avó imortalizada pelos poderes da natureza.

"Según el mito, Kueka era un joven Pemón Taure Pam que fue a buscar a la joven más bella de la comunidad Macuxi, irrespetando las normas establecidas por Makunaima, dios celoso y estricto Pemón, quien decía que los Pemón se debían casar con los Pemón y los Macuxi con los Macuxi. Luego de casarse, huyeron y tras ellos fue Makunaima, quien les encontró y les dijo: "Awarokuruu ...Amoro aukowamumo Chokroro tatapiche anapo daro..." (¡maldito eres, vivirás siempre abrazado con tu esposa!). Makunaima sopló al viento esta oración y Kueka y su esposa fueron convertidos en piedra. Hoy la piedra es la abuela y abuelo de los Pemón"

Anteriormente as duas pedras ficavam juntas:



Agora La Abuela está em Berlim:



Documentário venezuelano sobre o roubo do patrimônio religioso do povo Pemón.

Parte 01:

 Parte 02:

Monte Roraima e a Perambulação de Macunaima

O Monte Roraima se apresenta como um importante local para as etnias que vivem em seu entorno (em especial Ingarikó, Macuxi, Taurepang, e Ye'kuana) por ser a morada do Deus Macunaima - demiurgo de suas culturas.




O índios Macuxi contam que Macunaíma percebeu entre os dentes de uma cotia, adormecida de boca aberta, grãos de milho e vestígios de frutas que apenas ela conhecia; saiu, então, a perseguir o pequeno animal e deparou com a árvore Wazacá – a árvore da vida –, em cujos galhos cresciam todos os tipos de plantas cultivadas e silvestres de que os índios se alimentam. Macunaíma resolveu, então, cortar o tronco – Piai – da árvore Wazacá, que pendeu para a direção nordeste. Nessa direção, portanto, teriam caído todas as plantas comestíveis que se encontram até hoje, significativamente nas áreas cobertas de mata.


A perambulação de Macunaima - apresentada em livro de Mário de Andrade - é também contada na tradição oral destes povos. Essa tradição reconhece na geografia do Estado de Roraima os locais sagrados ligados à sua rota mítica.



"Para os indígenas da região, Makunaima tem uma existência real neste mundo. As marcas de sua passagem podem ser percebidas ainda hoje nas diversas realizações que deixou sobre a face da terra: transformou homens, mulheres, formigas e feridas em pedras, folha de plantas em arraia, grãos de areia em mosquito pium, dentre muitas outras obras e artes. Trata-se de um ser que desde menino já era esperto, a quem todos respeitavam pela astúcia de ser capaz de pegar anta no laço; detinha força e poderes mágicos; era capaz de castigar a todos os que se interpunham à realização de seus desejos mais imediatos. Sendo herói de uma cultura ágrafa, Makunaima ganha concretude para os Pemon por meio de um conjunto de narrativas que explica fatos diversos como a ocorrência de fenômenos naturais e de acidentes geográficos, bem como a forma de alguns animais e a existência das constelações visíveis naquela região, mas também como teriam sido criadas algumas fórmulas mágicas de cura, dentre outras coisas, como a escassez de árvores e o fato de existirem poucas frutas na região dos lavrados, em contraste com a maior abundância delas na face norte do Roraima. E foi exatamente por apresentarem essa ambiguidade, de terem sido os introdutores do mal no mundo ao mesmo tempo em que foram os criadores de coisas boas para o homem, que os Makunaima passaram a ser das personagens mais conhecidas do extremo norte da América do Sul".
Fábio Almeida de Carvalho - Makunaima/Makunaíma, antes de Macunaíma.Revista Crioula / Maio de 2009 - nº 5.